Para Nunca Mais Me Esquecer | O Marco Amador | Des

José Paulo | Paulo Meira | Rodrigo Braga - 2010-08-20 - 2010-10-08


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Para nunca mais me esquecer - José Paulo

Nos dois trabalhos apresentados , resultado de uma pesquisa mais recente , exploro a possibilidade da escrita e sua representação; utilizo letras, tipografias e outros elementos do universo tipográfico e gráfico.

O trabalho "Para Nunca Mais Me Esquecer" , grandes peças de madeira e ferro com todas as letras do alfabeto representam imensos ferros de marcar gado, onde a escrita aparece associada à dor, submissão e posse.

Apresento também, um trabalho da série "Cordel ": são tipos móveis feitos de cerâmica, expostos em uma linha de texto , apresentando de forma descritiva e direta o significado da palavra Dor.

O Marco Amador - Paulo Meira

“O Marco Amador” é o título da pesquisa artística que iniciei no ano de 2004, e cuja investigação norteadora é a construção de universos (plásticos e conceituais), onde acontecimentos homônimos (um marco amador) são tomados como medida ética, estética e política pelos quais personagens transitam em ambientes e situações desafiadoras.

Tais universos são construídos através de obras em vídeo que, por sua vez, depois de realizadas, são desdobradas em séries de pinturas e fotografias que apresentam imagens extraídas dos processos de execução do vídeo, ou remissivas ao universo conceitual deste.

Por todos estes acontecimentos sempre atuo como personagem-chave das situações, de modo que venho experimentando o imbricar de diversas linguagens ao meu processo artístico. Desde o seu início no ano de 2004, O Marco Amador resultou em quatro vídeos e quatro séries de pinturas e fotografias.

Desejo Eremita - Rodrigo Braga

Natural do Amazonas, mas há muito residente no nordeste brasileiro, o artista Rodrigo Braga vem abordando, em sua obra fotográfica, questões em grande parte autobiográficas, traduzidas por meio de relações de troca física e simbólica entre seu corpo, elementos e contextos naturais. Em sua recente residência de imersão numa zona rural entre as pequenas cidades de Tabira e Solidão – interior do estado de Pernambuco, distantes 400 km da capital Recife, onde vive –, o artista parte para uma situação de isolamento espacial e temporal amplamente diferente do seu cotidiano de grande cidade para criar a série intitulada Desejo eremita. Embora ainda em pleno processo, ele apresenta, nas próximas páginas, um recorte dessa produção que, deflagrada por uma vontade de isolamento geográfico, acabou assumindo também inesperadas dimensões sociais e humanas, como sugere a carta que Rodrigo escreve a um amigo ao final da primeira parte de sua experiência.

“Escrevo do sertão, entre Pernambuco e Paraíba, onde – você sabe – já estou há dois meses me dedicando integralmente a mim e ao meu trabalho. Por aqui ainda ficarei por mais uma semana para finalizar minha estadia de imersão. Há muito venho sofrendo com a distância do que deixei em Recife, sobretudo minha recém esposa e minha nova casa com ela. Nesse período, Clarissa veio aqui uma vez, mas ficou apenas três dias. Também fiz duas breves visitas ao Recife para matar as saudades e resolver pendências outras, mas é quase como se não tivesse ido, pois minha cabeça permaneceu aqui na caatinga verde e molhada nesse período chuvoso. Me acomodei numa casa como queria, ou ainda melhor do que imaginava. Aluguei um sítio de onze hectares na zona rural de Tabira, município vizinho a Solidão, lugar que escolhi para realizar meus “desejos eremitas”. De fato fico isolado numa casa agradável a três quilômetros da cidade, no alto de um morro de onde posso me deleitar de um belo pôr-do-sol todas as tardes. Aqui posso pensar melhor, sentir melhor, ler algumas coisas, enfim... ter a concentração que preciso para meu processo criativo, já que não encontro mais tantas condições na cidade grande. Por aqui o aspecto que mais me impressionou inicialmente foi a crueza (estupidez, diria) da violência de uma terra - para a minha surpresa - ainda sem lei. Parece mesmo que o cangaço e o coronelismo deixaram um legado significativo para o século XXI no nordeste, sem falar na ausência do poder público e da Justiça, é claro. Mata-se por muito pouco, mas não é como a oportunista violência urbana, é algo mais primitivo mesmo. Apesar da pobreza da região, quase não se mata para roubar, mas sim para a defesa de uma suposta honra (traduzida também pelo machismo e pela dominação econômica), o que leva a julgamentos precipitados e a truculentas violências à ponta de faca. Contudo, passada essa primeira impressão e receio, fui convivendo com essa carnalidade de maneira mais diluída, sem medos ou somatizações, posto que também passei a enxergá-la no cotidiano, não apenas nos relatos de casos da maneira de pensar e agir do sertanejo, como também na vida animal. Presenciar bois enrijecendo a carne ao serem martelados e sangrados até seu final, ver uma porca abortando e pisoteando seus filhotes moribundos, ouvir o trágico grito de uma rã antes de ser engolida por uma cobra, passar pela experiência de ser acuado por trinta touros no pasto, conviver com escorpiões, cobras e aranhas caranguejeiras na porta de casa, assim como ter recebido a notícia da morte do meu tio e o desespero da minha mãe em Recife, me fizeram refletir ainda mais sobre a morte e a tênue vida na terra. Curioso, vim para cá sobretudo em busca de um sossego e de uma paisagem simbólica que não encontraria onde vivo, mas acabei encontrando novamente o que já refletia em meu trabalho: o inevitável ciclo biológico ao qual todos os seres estão fadados.

Período: 20 de agosto a 8 de outubro de 2010.