Moira

Eva Le Campion - 2015-11-26 - 2016-01-24


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A pintura de Eva Le Campion entrelaça, questiona e ressignifica os caminhos, testemunha sua preocupação com a vida, como ser social que se emociona com a condição do outro. Palavras, frases, cores, texturas e ruídos, nos levam a uma experiência visual, tão barulhenta quanto o silêncio da mente, que ocasionalmente sussurra uma dor, um afeto, uma história.

“É o reflexo do meu processo de pensamento em experiência material. Uma vez destilando a matéria, em luzes sombras e formas, algo se transforma em mim e reflete na superfície transformada. Meu ofício diário de prazer e dor. Minha pintura é meu cobertor, meu tapete, meu pano de chão”. (Eva Le Campion)

Assim como as Moiras determinavam o destino dos deuses e dos seres humanos, fabricando tecendo e cortando aquilo que seria o fio da vida, o “Labirinto” de Eva – obra que se inicia a partir de um programa de atividades e oficinas de tecelagem e cerâmica, na antiga Cruz Vemelha de Maceió, pelas mãos de adolescentes de risco – aparece como tentativa de restaurar os fios de comunidades esquecidas, “mãos que tecem não roubam nem traficam, mãos que modelam não roubam nem traficam”.

O conjunto de obras denuncia e despe um modelo de sociedade de consumo que à medida em que avança, se abandona, como no caso dos “panos de chão” que trazem a dualidade do azul e do vermelho – referente a bandeira do estado de Alagoas – como pulsões, a questão da violência erotizada pelos jovens que possuem suas raízes arrancadas de seu curso natural como ruptura de uma parte da população desassistida pelas políticas públicas. “No Mito do Herói, segundo Carl Jung, o homem vive a experiência limite entre sucumbir diante das forças do inconsciente e das adversidades da vida ou superar a si mesmo e vencer os obstáculos. A experiência do Mito do Herói encontrei de forma aguçada entre os adolescentes de risco, das instituições por onde trabalhei. Entre vida e morte, as histórias são tecidas em fios de tinta, do início, meio e fim e isto inclui a mim mesma.” (Eva Le Campion)

A mostra traz também o barro (grande paixão de minha mãe Eva) que por sua vez em potência primitiva, reafirma a importância vital do contato do homem com a terra como retorno à origem, ao passo que se coloca de forma questionadora diante do comportamento predatório dos seres humanos, é o caso de “Ceia Larga” em que mesa posta convida-os para um banquete com os olhos. A vida que se alimenta da própria vida. Tapetes, cerâmicas, cobertores, sedas, panos de chão se tornam peças de um grande quebra-cabeça da longa trajetória de Eva, que ao deixar o paraíso segue na tentativa de resgatar os filhos da terra. Um encontro com o próximo, um encontro de si mesmo.

Flora Le Campion Uchoa