Entrópicos

Martha Araújo - 2002-11-21 - 2002-12-20


- Atualizado em

ENTRÓPICOS

A maior provocação dos Entrópicos de Martha Araújo é apontar para a liberdade decorrente do processo de decomposição que rege o universo. Não podemos ficar inertes aos materiais usados pela artista, que consegue dar uma continuidade a sua pesquisa sensorial-tridimensional na arte-objeto.

Em alguns trabalhos a matéria orgânica e perecível se mistura com perfeição à matéria inorgânica, não muito menos perecível, num processo contínuo que apreende e retira o espectador de seu mundo vertical, com total exploração dos seus sentidos.

Martha experimenta chapas de ferro oxidadas pela maresia, o pó formado em sua superfície, sal grosso, gordura animal, peças defumadas de porco. A experiência da temporalidade é uma rara percepção oferecida quando dirigimos nosso olhar cartesiano para uma vontade de ordem universal: a implacável libertação das substâncias formadoras da matéria e sua disponibilidade no ambiente para um outro uso.

Esses estímulos exigem que o receptor caia num tempo dessacralizado, racionalizado, desenhado por datas de validade. Um tempo que tem fronteiras determinadas pelas etiquetas dos supermercados. Nosso tempo. A combinação desses elementos proporciona uma apreciação transitória de uma arte em metamorfose. Ensina que o espectador pode, com frieza ou paixão, ser ainda mais temporário.

É impossível não pensar na manutenção desses trabalhos orgânicos, que desafia o valor canônico da duração de uma obra de arte. Igualmente impossível, é não pensar no valor metafórico de nossa data de validade e da nossa ansiedade de violar leis físicas. O jogo se configura.

Luciano Padilha Alves